Ação monitória e planilha abusiva: quando cabe revisão judicial

Texto jurídico sobre revisão de planilhas abusivas em ação monitória e proteção do consumidor

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Ação monitória e planilha abusiva: quando cabe revisão judicial

Quando um banco ajuíza ação monitória com base em contrato genérico, faturas soltas e uma planilha unilateral de cálculo, o consumidor não precisa aceitar o valor cobrado como “certo e líquido”. Pelo contrário. Se a planilha estiver contaminada por encargos abusivos, o Judiciário pode — e deve — revisar o débito, expurgar excessos e, se necessário, julgar a demanda improcedente. Neste artigo, explico, de forma objetiva e prática, como essa revisão funciona e em quais situações ela se aplica.

O que é a ação monitória e por que a planilha importa

A ação monitória exige prova escrita que demonstre, com clareza, a existência e a extensão da dívida. Assim, a planilha de cálculo precisa apresentar a memória discriminada da evolução do débito, com critérios transparentes. Do contrário, o título pretendido perde a liquidez e não pode se converter em obrigação executável. Além disso, sempre que o banco juntar somente planilha unilateral e documentos incompletos, o juiz pode indeferir a pretensão ou determinar a revisão judicial antes de qualquer cobrança adicional.

Quando a planilha perde a liquidez

A planilha perde a liquidez quando embute: (i) juros remuneratórios muito acima da média de mercado para a modalidade; (ii) capitalização não pactuada; (iii) cumulação indevida de encargos (juros remuneratórios, juros de mora, multa, comissão de permanência e IOF). Nessas hipóteses, a conta se torna obscura. Portanto, o consumidor pode impugnar a idoneidade desses documentos e pedir a readequação do valor, com base na legislação processual e consumerista.

Como os tribunais têm decidido

Nos últimos anos, decisões reiteradas reconheceram que planilhas unilaterais com encargos ilegais não bastam para a ação monitória; elas exigem depuração e, quando a abusividade se confirma, o valor deve se restringir ao montante incontroverso. Além disso, sempre que o banco ignora a obrigação de detalhar a evolução da dívida, os julgados têm afastado a liquidez, limitado os juros à taxa média de mercado e expurgado cobranças indevidas. Assim, a prática forense caminha no sentido de privilegiar transparência, equilíbrio e boa-fé na relação contratual. :contentReference[oaicite:0]{index=0}

CDC, inversão do ônus e boa-fé: três eixos de proteção

Primeiro, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) se aplica às instituições financeiras. Segundo, a inversão do ônus da prova pode ser decretada para obrigar o banco a demonstrar a legalidade dos encargos e a autenticidade da contratação. Terceiro, a boa-fé objetiva e o dever de informação exigem clareza sobre taxa efetiva anual, periodicidade, soma total a pagar e critérios de atualização. Desse modo, quando faltam esses elementos, o contrato se torna desequilibrado e a planilha, impugnável.

Taxa Selic como critério único de atualização

Quando o juiz afasta encargos ilegais (por exemplo, capitalização não pactuada ou cumulações indevidas), ele precisa substituí-los por um parâmetro objetivo. Aqui, a taxa Selic cumpre papel central, pois reúne correção monetária e juros de mora em um único índice. Desse modo, o risco de bis in idem desaparece e a conta fica mais simples, previsível e fiel à legislação vigente.

O que fazer se você recebeu uma monitória com planilha abusiva

Se você recebeu uma cobrança com planilha unilateral e encargos questionáveis, atue com método:

  1. Impugne, de forma específica, cada encargo que considerar abusivo (taxa mensal, capitalização, cumulação, IOF, comissões).
  2. Apresente seu demonstrativo com o valor que entende correto, discriminando os critérios de cálculo.
  3. Requeira a revisão judicial do débito, com expurgo do excesso e limitação a valores incontroversos.
  4. Peça, quando cabível, a inversão do ônus da prova e a aplicação da Selic como índice único de atualização.

Assim, você restabelece o equilíbrio contratual, reforça o dever de transparência e evita a constituição de um título judicial em montante indevido.

Conclusão

Planilhas unilaterais e obscuras não geram liquidez. Encargos abusivos não se consolidam em título executivo judicial. Por isso, a revisão judicial é medida necessária para impedir cobranças ilegais e para ajustar o débito a parâmetros legais e de mercado. Afinal, a boa-fé, a informação clara e a proporcionalidade não são adornos: são pilares que garantem justiça, previsibilidade e segurança nas relações de crédito.

Assinatura: Paulo Vitor Faria da Encarnação — OAB/ES 33.819 — Santos Faria Sociedade de Advogados (Vila Velha/ES)


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