Abandono afetivo: quando cabe indenização por dano moral (STJ)

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Abandono afetivo: quando o STJ admite indenização por dano moral

Resumo rápido: o Superior Tribunal de Justiça consolidou que amar é faculdade, cuidar é dever. Assim, quando o genitor viola o dever jurídico de cuidado, o abandono afetivo pode gerar compensação por dano moral. Além disso, a decisão reforça que o cuidado é um valor jurídico protegido pela Constituição Federal.

Abandono afetivo: conceito em linguagem direta

Em termos práticos, o abandono afetivo ocorre quando o responsável, podendo agir, descumpre o dever de cuidado e compromete o desenvolvimento emocional do filho. Portanto, o que se avalia não é o amor, mas sim o comportamento objetivo, a presença, o apoio e o acompanhamento constante.

Além disso, a jurisprudência reconhece que o afastamento voluntário causa danos psicológicos duradouros, pois interfere na autoestima e na formação da identidade. Desse modo, o Direito busca reparar o prejuízo emocional causado por omissão grave e injustificada.

Abandono afetivo e os fundamentos do STJ

O STJ aplicou a responsabilidade civil às relações familiares e reconheceu a possibilidade de compensação por dano moral no abandono afetivo. Além disso, a Corte enfatizou que a Constituição impõe prioridade absoluta à criança e ao adolescente, de modo que o dever de cuidado possui natureza jurídica, e não apenas moral.

Desse modo, o julgamento reafirma a ideia de que o Direito de Família deve caminhar ao lado da dignidade da pessoa humana. Assim, quando o cuidado é violado, o ordenamento jurídico responde com a reparação civil, justamente para restaurar o equilíbrio das relações familiares.

Tese-chave (STJ): “Amar é faculdade, cuidar é dever.” O descumprimento do dever de criação, educação e companhia configura ilicitude por omissão e pode gerar dano moral indenizável.
Base legal: CF/88, art. 5º, V e X (direitos da personalidade); CF/88, art. 227 (prioridade absoluta e proteção contra negligência); CC, arts. 186 e 927 (ato ilícito e reparação).

Abandono afetivo e o núcleo mínimo de cuidados

O Tribunal destacou que existe um núcleo mínimo de cuidados parentais, o qual inclui presença, orientação, suporte afetivo e acompanhamento. Assim, se o responsável falha de modo grave e injustificado, a omissão viola a dignidade do filho e rompe a proteção constitucional.

Além disso, o julgador deve sempre ponderar a realidade social e econômica dos pais, a fim de distinguir o descuido voluntário das limitações concretas. Dessa forma, evita-se punir quem não pôde cuidar, mas apenas quem deliberadamente negligenciou o dever legal.

Checklist do núcleo mínimo (referencial prático)
  • Presença ativa e regular, ainda que com arranjos familiares complexos.
  • Contato e participação em marcos de vida, como escola, saúde e lazer.
  • Suporte emocional e orientação cotidiana, mesmo à distância.
  • Trato igualitário em relação a outros filhos, salvo justificativa legítima.

Abandono afetivo: quais provas ajudam

Embora cada caso seja único, o ideal é organizar as evidências de forma objetiva. Assim, o processo torna-se mais claro e eficiente. Além disso, as provas ajudam o juiz a compreender o padrão de omissão e o impacto psicológico sofrido.

ElementoExemplos de provaObservações
Omissão prolongadaMensagens ignoradas, ausência em eventos, histórico de visitasDemonstre padrão contínuo, não apenas um episódio isolado
Desigualdade entre filhosComparativos de suporte e cuidadoEvidencie tratamento discriminatório e injustificável
Impacto psicológicoLaudos técnicos, relatórios clínicos, testemunhosComprova nexo causal e extensão do dano

Além disso, o STJ ponderou que laudos especializados ajudam muito, mas não são a única forma de comprovar o sofrimento e a violação do dever jurídico de cuidado.

Abandono afetivo e indenização: critérios e parâmetros

O Tribunal reconheceu a indenização por dano moral e reduziu o valor fixado na origem. Portanto, a Corte reafirmou que só revisa o valor da compensação em casos de quantias irrisórias ou excessivas.

Contudo, o STJ fixou parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade. Desse modo, o valor de R$ 415.000,00 foi reduzido para R$ 200.000,00, levando em conta a culpa, o sofrimento e as particularidades da relação familiar.

Parâmetro do caso líder:
  • Reconhecimento da responsabilidade civil por abandono afetivo.
  • Redução do valor para R$ 200.000,00 (data-base: 26/11/2008), com correção monetária.
Cada caso possui suas próprias circunstâncias; por isso, o valor serve apenas como referência.

Embora o voto vencido tenha advertido para o risco de “patrimonializar mágoas íntimas”, a maioria reconheceu que a violação grave do dever de cuidado gera responsabilidade civil. Assim, o precedente consolidou o entendimento de que o afeto também tem valor jurídico.

Abandono afetivo: roteiro prático em 6 passos

  1. Mapeie os fatos e identifique omissões relevantes; organize uma linha do tempo coerente.
  2. Reúna provas materiais e testemunhais; documente cada etapa do afastamento.
  3. Avalie impactos emocionais e sociais; considere relatórios técnicos e terapêuticos.
  4. Compare tratamentos entre irmãos, quando houver; destaque eventuais discriminações.
  5. Fundamente o pedido com base na CF/88 e no CC, incorporando a tese do STJ.
  6. Quantifique a indenização com prudência e proporcionalidade; evite exageros.

Abandono afetivo: perguntas frequentes

1) Bastam poucos episódios para caracterizar? Geralmente, não. Assim, o julgador observa padrão de omissões relevantes e injustificadas.

2) Preciso de laudo psicológico? Ajuda muito, mas não é a única via de prova. Contudo, ele fortalece o nexo causal e a extensão do dano.

3) O valor é automático? Não. Dessa forma, cada caso demanda análise concreta da gravidade e das circunstâncias pessoais envolvidas.

Autor: Paulo Vitor Faria da Encarnação – OAB/ES 33.819 – Mestre em Direito Processual pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) – Sócio do escritório Santos Faria Sociedade de Advogados – Vila Velha/ES – E-mail: [email protected] – Telefone: (27) 99615-4344.

Este texto tem caráter informativo e não substitui a análise individual do caso concreto.

Fonte: REsp 1.159.242/SP (3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/04/2012, DJe 10/05/2012).

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